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Coronavírus, advocacia e o judiciário brasileiro. Por Frederico Cortez

Frederico Cortez é advogado, sócio do escritório Cortez&Gonçalves Advogados Associados. Especialista em direito empresarial. Assessor jurídico na Secretaria de Defesa Social no município de Caucaia-Ce. Co-fundador do Instituto Cearense de Proteção de Dados- ICPD-Protec Data. Consultor jurídico e articulista do Focus.jor. Escreve semanalmente.

Por Frederico Cortez
cortez@focus.jor.br

As relações pessoais e comerciais já estão sentido os efeitos do novo coronavírus em terras brasileiras. Com o judiciário, não poderia ser diferente! Diversos tribunais já baixaram portarias disciplinando as novas regras em decorrência do Covid-19. Desde a semana passada, várias Cortes judiciais adotaram o teletrabalho para grupo de risco como medidas de contenção da transmissão do coronavírus. Agora, a receita foi mais dura e impactante com a suspensão de audiências e de prazos processuais. O resultado que se espera é a redução do convívio social no ambiente de trabalho, bem como a contaminação para quem busca a justiça. No geral, o prazo mínimo adotado foi de 15 dias e no máximo de 30 dias.

Na última sexta-feira,13, o Supremo Tribunal Federal (STF) baixou a Resolução 663/2020 que determinou a suspensão do atendimento presencial para advogados partes, visitação pública e outras ações restritivas junto ao prédio do STF. No entanto, nas sessões de julgamento somente terão acesso ao Plenário e às Turmas do STF as partes e os advogados de processos incluídos na pauta do dia, bem como estarão autorizados a participar as pessoas  habilitadas em audiências públicas. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) agiu antecipadamente ao STF, e já na quinta-feira passada,12, a ministra Maria Cristina Peduzzi, presidente do TST, editou o Ato GDGSET.GP. nº 122, um conjunto de medidas para impedir ou reduzir a transmissão do novo coronavírus dentro da edificação da Corte trabalhista. Dentre elas, destacam-se: suspensão de eventos, viagens, reuniões presenciais, visitação pública e atendimento presencial. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não foi diferente, pois a Resolução Administrativa nº 01/2020 foi formatada nos mesmos moldes das instâncias já apontadas. Aqui, depreende-se que todas caminharam irmanadas no mesmo sentido e sem haver ações diversas.

Já nas instâncias inferiores, os Tribunais de Justiça e do Trabalho passaram a emitir portarias suspendendo atendimento presencial, audiências e prazos. Em relação ao último (suspensão de prazo processual), há uma divergência por parte de algumas Cortes judiciárias. O Tribunal de Justiça do Ceará, por meio da Portaria 497/2020resolveu suspender o atendimento presencial, audiências e sustentações orais pelo prazo de 30 dias, mas manteve os prazos processuais. Assim, advogados e partes não poderão despachar pessoalmente com os julgadores dentro do lapso temporal. Já o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), através da Resolução Corpo Diretivo 01/2020 foi mais além que as demais casas de justiça estaduais. Manteve a suspensão do atendimento presencial e audiências e avançou em sustar os prazos processuais, seguindo assim o mesmo norte com a interrupção dos trabalhos até o dia 31/03.  De outra banda, o Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (Ceará), não suspendeu os prazos processuais, limitando-se tão somente a não realização das audiências e atendimento presencial até 27/03.

Assim, no caso do TRT 2 vigorou a aplicação do ensinamento básico dos pilares do direito, quais sejam: princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. Sem dúvidas, que há um descompasso nas decisões administrativas de outros tribunais em sobrestar as audiências e manter os prazo processuais, uma vez que há um desequilíbrio ao adotar medidas com pesos diferentes para o judiciário e para a advocacia.

Nesse sentindo, como um advogado irá despachar uma petição, com liminar, ou recurso, de modo a necessitar uma audiência presencial com o juiz ou desembargador? O direito do advogado de ser atendido fisicamente pelo julgador é a espinha dorsal do exercício da advocacia. Respeitosamente, não cabe ao Poder Judiciário impor o tipo de atendimento numa situação ímpar e adversa que enfrentamos, onde ao mesmo tempo as audiências estão suspensas e os prazos correrem normalmente como se nada estivesse acontecendo. Infere apontar, que a audiência é um ato pessoal e presencial afeito ao advogado. Se aqui está objetada, por qual razão os prazos processuais não seguiram a mesma inteligência de suspensão?

Na data de ontem,16, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) encaminhou o Ofício nº 240/2020 com sugestões para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dentro desse habitat do novo coronavírus. No documento, mais precisamente no item 01, a instituição desidrata-se ao não requerer a suspensão dos prazos processuais, limitando-se tão somente a reproduzir o que os demais tribunais e Cortes judiciais já determinaram. Chama a atenção aqui, que logo após requerer a não suspensão dos prazos processuais, a OAB sugere ao CNJ no item 03 do ofício que “para os casos de perecimento de direito ou prescrição, bem como outros casos que o magistrado considere urgentes, as audiências poderão ser mantidas, com as cautelas e os protocolos devidos para evitar aproximação pessoal de partes, advogados e funcionários, nos termos do recomendado pelas autoridades competentes“. Ora, estou tentando entender essa “diretriz oabeana” até agora! Como será possível isso, se os tribunais suspenderam as audiências e o atendimento presencial e a OAB nacional quer a realização das audiências como forma evitar o risco do perecimento do direito ou prescrição do direito da parte? Repiso, ainda tentando entender tal redação oabeana-nacional! Em resumo, em nada inovou tal ofício! Ou seja, deu volta em círculos.

Verdade seja única, que diante das ferramentas tecnológicas à disposição, o poder judiciário não necessita parar em toda sua completude em razão do estado adverso imposto pelo Covid-19. Atos importantes como expedição de alvarás, mandados de bloqueios em contas bancárias, veículos e imóveis, podem e devem seguir a sua ordem natural. Com relação às comunicações com as secretarias judiciais, nem todas adotam um padrão de informação, haja vista não serem simpáticas a tal modelo tecnológico. Um exemplo, disponível de forma gratuita e já ofertado é o aplicativo Comunicação Pública, que permite advogados interagirem com as varas judiciais. Nessa ferramenta, não há incidência pecuniária para o Poder Judiciário. Infelizmente, é um caminho ainda a ser desbravado por aqueles que resistem à comodidade e eficiência das plataformas digitais.

Em tempos de reclusão forçada em busca do bem maior, que é a segurança da coletividade, a tecnologia é uma aliada e não uma parede a se transpor. Com certeza, após o fim dessa pandemia viral, o novo coronavírus nos deixará importantes lições de trato pessoal e profissional. Assim entendo, que daremos mais importância a pequenos e valorosos atos até então ignorados por julgarmos (aqui me incluo também) invisíveis aos nossos olhos falhos. A rotina tem que mudar para combater o Covid-19, mas isso não significa que as relações comerciais, profissionais e públicas venham a ter que parar completamente. O momento é de todos darem a sua contribuição. Todos iremos perder, mas ganharemos num futuro próximo. A regra de ouro é se adaptar de forma inteligente e ao menor custo. Ajustemo-nos, então!

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