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Você nunca ganhará o que produz. Por Henrique Lyra Maia

Henrique Lyra Maia, Bacharel em Administração de Empresas, Especialização em Administração Financeira e Mestrado em Administração de Empresas pela Universidade de Fortaleza, Especialização em Gestão Empresarial pela FGV e Doutorando em Contabilidade e Finanças pela FUCAPE Business School. Sócio da LYRA&MAIA Consultores Associados.

É muito comum encontrar pessoas se queixando de que não recebe o valor justo do seu trabalho. Esse questionamento alimenta de certa maneira o pensamento Marxista de que o empresário explora o trabalhador, porque ele não recebe tudo aquilo que ele produz.

Esse artigo pretenderá mostrar ao leitor de que não apenas o trabalhador, mas nenhum fator de produção irá receber exatamente o que produz. Pelo contrário, todos os fatores de produção necessariamente deverão receber menos do que produz e que isso não constitui exploração, mas uma condição para que o sistema econômico funcione.

Para entender melhor essa questão, parte-se da premissa de que a lei da oferta e demanda seja relativamente familiarizada pelo leitor. De acordo com essa lei econômica, o preço dos produtos que serão vendidos por uma empresa será definido pela demanda e oferta por esse produto no mercado.

A partir da demanda, o empreendedor irá organizar fatores de produção (máquinas, equipamentos, estrutura física, mão de obra, capital, etc) para produzir o produto ou serviço que o cliente necessita. O empreendedor irá estimar qual a contribuição que cada fator de produção tem para o produto a ser produzido, de modo que cada fator terá seu preço estabelecido de acordo com essa contribuição. Por exemplo, um proprietário de uma padaria, terá que definir qual a contribuição que o padeiro, a farinha de trigo, açúcar, fermento, ovos e a margarina tem para fazer um bolo e assim estimar o preço que estará disposto a pagar por esses fatores de produção.

Note que se o empreendedor pagar acordo com sua contribuição, então o preço de venda final seria exatamente igual ao custo de produção. Se o empreendedor permitir que isso aconteça, ele não teria nenhuma rentabilidade pelo emprego do capital nesse processo. Todos os fatores de produção estariam sendo pagos de acordo com sua produtividade. Para que o empreendedor tenha um retorno do capital investido, ele deve descontar da produtividade de cada fator de produção uma taxa do retorno do capital empregado.

Portanto, se a taxa natural de juros for de 10% a.a. e o risco da atividade que o empreendedor está inserido tiver um prêmio adicional de 5% a.a., logo, todos os fatores de produção terão que ser descontados do seu valor em aproximados 15% a.a. Assim, nenhum fator de produção conseguirá auferir no mercado todo o valor que ele gera, porque o empreendedor desconta dessa produtividade a parte que lhe cabe.

Como consequência, todos os fatores da economia irão render a sua produtividade marginal descontadas a taxa natural de juros somados ao risco da atividade específica do empreendedor. A taxa natural de juros é igual para todos da economia, o que vai diferenciar é o risco específico da atividade que o empreendedor está inserido, por isso, podemos ter taxas de descontos diferentes entre setores, segmentos e elos da cadeia.

Seguindo essa lógica, o processo de imputação de preços da economia vem de trás para frente, ou seja, do cliente final até o produtor de commodities. O cliente final decide quanto está disposto a pagar pelo produto, a partir disso a empresa que tem o primeiro contato com esse cliente irá organizar os fatores de produção, avaliar a contribuição de cada um para o produto a ser produzido e descontar da produtividade marginal a taxa de retorno total exigida. Assim, os custos são avaliados conforme o preço que o cliente está disposto a pagar e não o contrário.

Isso pode ser revelador para muitas pessoas, porque sob essa ótica, nenhum fator de produção, incluindo o trabalhador, irá receber exatamente o que produz. Aquela sensação que o empregado tem de estar sendo “explorado”, na verdade, é justamente a parte que cabe ao empreendedor para que ele remunere o seu capital. Se ele pagar exatamente o que cada funcionário produz, então o empreendedor não terá seu capital remunerado, assim, ele não terá incentivo a criar nenhuma empresa para empregar capital, portanto, estaríamos em uma situação de desemprego em massa.

O socialista Karl Marx via esse desconto que o empresário dava no valor recebido pelo empregado como “mais valia”. Na visão marxista, tudo que o trabalhador produz, a ele pertence. No entanto, Marx não entendeu que assim como o trabalhador precisa ser remunerado pelo uso da sua força de trabalho, o empresário também deve ser remunerado por empregar capital, a forma como o empreendedor obtém sua remuneração é descontando parte da produtividade dos fatores de produção no valor equivalente a taxa de retorno. Assim, todos os fatores de produção da economia não serão pagos o valor exato da sua produção, eles serão sempre descontados a taxa de retorno total para remunerar o capitalista.

Onde está a exploração? O empreendedor poderá “explorar” os empregados se ele conseguir descontar um fator de produção além da taxa de retorno total. É o que chamamos de lucro econômico. No exemplo anterior, digamos que ele desconte um fator de produção a 20% a.a., em vez de 15% a.a. como exigida pela taxa de retorno. Os 5% a.a. a mais de desconto será o lucro econômico obtido nessa transação. Nessa situação, poderia haver um sentimento de “exploração”, porque o empresário estaria obtendo um lucro econômico nessa transação.

No entanto, a tendência do mercado é sempre para o equilíbrio, ou seja, os fatores de produção irão convergir para o desconto de 15% a.a. e não de 20% a.a. Ao longo do tempo, empregados insatisfeitos iriam migrar para locais onde sua produtividade poderia ser maior ou sofrer uma taxa de desconto menor.

O processo ocorreria mais ou menos assim. As empresas em outros locais da economia que necessitam contratar pessoas irão oferecer, por exemplo, uma taxa de desconto de 18% a.a. Assim, o empregado irá deixar a empresa atual e aceitar o contrato de trabalho na outra. Uma terceira empresa, necessitando de mão de obra qualificada, irá oferecer ao mesmo trabalhador uma taxa de desconto de 16% a.a., fazendo com que ele obtenha mais uma vantagem de mudar de local em local. E assim sucessivamente até chegar nos 15% a.a. que seria o equivalente a taxa de retorno exigida.

O empreendedor que estava auferindo lucros econômicos por descontar 20% a.a. do empregado, terá que procurar um trabalhador para colocar no lugar do anterior. Isso gera custos ao empregador, porque ele terá de realizar o recrutamento, a seleção e o posterior treinamento.

O processo de mercado embute em seu sistema uma forma de eliminar os excessos praticados por empreendedores, dessa forma, a tendência é que esse empreendedor desconte cada vez menos para reter mais os trabalhadores, até chegar a taxa de desconto compatível com a taxa de retorno total. Como consequência, os 5% a.a. que o empresário desconta a mais, serão ao longo do tempo, eliminados pelo processo de mercado.

Na prática, ainda vemos empreendedores mantendo taxas de descontos “excessivas” aos salários dos trabalhadores, gerando a sensação de “exploração”, pois há uma distância muito grande naquilo que o empregado produz versus o que ele recebe. É como se muitos empresários estivessem obtendo lucros econômicos duradouros, não sendo possível identificar na prática essa eliminação.

No entanto, isso ocorre porque no Brasil há um excesso de regulações e intervenções estatais em todos os vetores econômicos. Isso faz com que haja uma enorme dificuldade para se criar novas empresas. A competição por trabalhadores tende a ser menor do que seria se não houvesse essas intervenções.

Em um mercado livre de intervenção estatal, todas essas explorações seriam temporárias porque seria muito mais fácil criar e fechar uma empresa, assim como contratar e demitir pessoas. O mercado seria muito mais dinâmico e responderia muito mais rapidamente aos excessos praticados por esses empresários. Se há uma “exploração” duradoura por parte dos empresários, a culpa não é deles, mas do excesso de burocracia que se tem para empreender, contratar e demitir pessoas. Quem cria o ambiente favorável a essa “exploração” é o próprio estado.

Isso não quer dizer que muitos empresários não tenham a intensão deliberada de “explorar”, mas em um sistema com baixos níveis de intervenção estatal, esse empresário iria sofrer muitos prejuízos por adotar esse comportamento.

O grande causador desse processo – as regulações e dificuldades criadas pelo estado – é justamente aquele que se diz ser o “defensor” do trabalhador. Uma falácia que foi e é dita por muito tempo e que infelizmente se tornou “verdade”.

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