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Tabelamento de preços é sempre uma má ideia. Por Igor Lucena

Articulista do Focus, Igor Macedo de Lucena é economista e empresário. Professor do curso de Ciências Econômicas da UniFanor Wyden; Fellow Associate of the Chatham House – the Royal Institute of International Affairs  e Membre Associé du IFRI – Institut Français des Relations Internationales.

O Brasil já passou muitos anos utilizando a política do tabelamento de preços ou seu controle com objetivos hipoteticamente “sociais”. Essa ideia de que ao tabelar preços o Governo está praticando uma boa ação para os mais pobres, tornando acessível a todos bens e serviços com preços populares ou dentro do orçamento das classes mais baixas, já mostrou que tem um prazo de durabilidade curtíssimo.

Seja na época do presidente José Sarney, em que a inflação era galopante e as políticas eram heterodoxas ou mirabolantes e se mostravam dia e noite com a tentação de tabelar a maioria dos bens e serviços com o objetivo de conter a inércia inflacionária, seja no governo Dilma, em que o tabelamento de preços de energia elétrica se mostrou um completo desastre financeiro para as companhias, que teve como sucessão aumentos vigorosos na tarifa durante os três anos subsequentes, o que se viu foi desastre e sofrimento principalmente para as classes menos favorecidas. Esse foi o resultado dos tabelamentos decretados pelo Governo que obrigou as empresas a represar os custos de produção para o consumidor final, sempre gerando custos maiores para o futuro.

Dentro de uma economia de mercado não pode haver “canetadas” políticas, pois as empresas se organizam de acordo com as suas bases gerenciais de seus insumos, de seus custos de produção, incorporam o aumento do salário mínimo, o aumento nas alíquotas de impostos e levam em consideração sempre o preço dos concorrentes para que possam chegar a um valor que reflita necessariamente a equação: LUCRO = RECEITA – CUSTOS.

Dito isso, vale lembrar que todo insumo, todo serviço e todo produto tem seu preço, e os juros que são cobrados pelos bancos aos seus clientes funcionam da mesma maneira; ou seja, levam em conta os custos de captação, as taxas de juros locais e internacionais, a probabilidade de calotes, os impostos e outras dimensões cada vez mais complexas de um mercado financeiro.

Como foi noticiado na semana passada, o Senado Federal aprovou uma lei, ainda pendente de análise na Câmara dos Deputados, que determina, segundo informações da Agência Senado, que o teto da cobrança será de 30% ao ano para juros de cartão de crédito e de cheque especial. No caso das fintechs (pequenas instituições financeiras, geralmente on-line), a taxa pode chegar a 35% ao ano. Superar esse patamar será considerado crime de usura até o final deste ano.

Mais uma vez o Brasil volta à ideia dos tabelamentos, que não funcionaram em nenhum lugar do mundo, e parece que seus representantes nada aprenderam após 30 anos de erros e acertos na política econômica. Congelamento de preços nunca é e nunca será a solução; isso apenas gerará mais distorções e mais custos para o futuro. Logo explico, pois ao tabelar os juros do cartão de crédito e do cheque especial, as instituições financeiras poderão unilateralmente cancelar os cartões e os limites daqueles clientes que sempre pagam com atraso ou que se mostram com um considerado risco de calote junto aos bancos.

Outro fator que naturalmente irá acontecer é que os bancos deverão aumentar os custos de transação para outras linhas de crédito; ou seja, a diferença dos juros será repassada para outros clientes que usam outras linhas de créditos, como para empresas ou para a compra de veículos. É importante lembrar também que as tarifas podem ser outro instrumento de compensação desse tabelamento, repassando o real custo do cartão de crédito e do cheque especial para todos os outros clientes do banco.

Não estou neste texto fazendo uma defesa do setor bancário, que sem dúvidas cobra altos juros em suas operações, mas também devemos lembrar que o Brasil é um dos poucos países do mundo em que se tributa a intermediação financeira no momento da contratação; ou seja, paga-se o imposto sem saber se haverá inadimplência. O Brasil é um dos países mais difíceis do mundo para se reaver bens que são alienados aos bancos, principalmente imóveis.

Entretanto, o meu ponto de vista principal é que a ideia básica do Projeto de Lei 1.166/2020, que estabelece que “Esse endividamento no cartão de crédito e de cheque especial vai gerar um passivo enorme, drenar os minguados recursos das famílias brasileiras e dificultar ainda mais a retomada da atividade econômica” pode parecer algo bom para ajudar os mais pobres; contudo, já cansamos de ver políticas econômicas com boas intenções e não baseadas em princípios econômicos de mercado que terminam sempre em tragédias e custos maiores para todos.

Outro dano importante é o Moral Hazard, ou o risco moral, que agora se apresenta no Brasil, que é a abertura da possibilidade, em um momento pós-Real, de darem início a políticas de tabelamento, indiscriminadamente e sem estudos, sempre que houver crises financeiras ou eventos emergenciais como se fosse uma solução crível.

Espero que a Câmara dos Deputados e o presidente Jair Bolsonaro vetem esse projeto, que disfarçado de uma ajuda aos mais pobres transformar-se-á em um modelo para desarranjar todo o sistema financeiro nacional. Neste ritmo, com políticas venezuelanas, daqui a pouco o Senado vai decretar uma lei para que a Bolsa de Valores nunca possa cair; dessa forma, todos os pequenos investidores terão lucros sempre.

Brasil, aprende e acorda!

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