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Raimundo Fagner: Iluminando os gritos das crianças

Fagner, O Musical, encenado no Cineteatro São Luiz, em Fortaleza, em 2019: espetáculo em homenagem aos 70 anos do cantor e compositor. Foto: Antonio Carlos Dias de Oliveira/Fundação Social Raimundo Fagner

Esta narrativa trata de uma história que vivenciei na Secretaria da Fazenda, em meados de 1998 para 1999, quando estava à frente da Superintendência da Controladoria da Secretaria da Fazenda, na gestão do nosso ilustre Secretário Ednílton Soárez.

Uma das missões de ser servidor público é cuidar do bem comum, esta prerrogativa nos traz enormes possibilidades e oportunidades que nos fortalecem na labuta diária e intensifica e amplifica a responsabilidade, que nos entoa de satisfação sobre os resultados do bem comum.

Em um dos dias desse ano de 1998, recebi uma ligação por volta das 14 horas e, ainda sem almoçar, Lourdinha, que faz o papel de atendimento, havia transferido uma ligação de uma pessoa que tinha se identificado como Fagner e que procurava saber de um programa de investimentos para poços artesianos. Esta pessoa dizia no telefone que apoiava a comunidade de Orós e, no período de estiagem, a abertura dos poços amenizava a carência hídrica da região. Lourdinha anotou e depois recebeu uma segunda ligação e me repassou. Do outro lado da linha atendia uma voz rouca e forte que se identificava como Fagner.

Ao ouvi-lo, antes do almoço, estafado e assoberbado de atividades e envolto de impaciência disse a pessoa que se identificava como Fagner que, se ele era o Fagner e ligando para isso, eu seria o Roberto Carlos! O sujeito caiu na gargalhada e começou a apresentar indícios fortes que eu estava errado, inclusive na minha presunção.

Na época, ainda dizíamos “a ficha caiu” e na realidade a ficha caiu sem ele precisar cantar. Percebi que estava falando com ele mesmo – Raimundo Fagner. Fagner já tinha um trabalho intenso em Orós e sempre contribuiu com o município, inclusive divulgando a cidade em seus trabalhos artísticos. Pois bem, após as minhas devidas desculpas, selecionei o processo e levei ao Dr. Ednílton para a liberação.

Passados uns 3 meses, recebi a ligação do gerente do Banco do Brasil, que me pediu orientação e apoio técnico para contribuir com a criação de instituição, sem fins lucrativos, que atuaria com arte e educação musical e que teria apoio da Fundação Banco do Brasil, aí começava a se desenvolver a ideia da Fundação Raimundo Fagner.

Eu havia coordenado um grupo, junto com meu amigo fazendário Neto Cysne, onde contribuímos com a Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, o grupo envolveu vários colegas fazendários, colegas professores da Universidade Federal do Ceará e meus alunos dos cursos de pós-graduação da UFC. Este trabalho propiciou um enorme engajamento de pessoas comprometidas com a cidadania e a responsabilidade social, outra experiência que merece um relato e um registro posterior.

A experiência desse projeto com a Santa Casa, possibilitou que pudéssemos ajudar na gestação da Fundação Raimundo Fagner. Tivemos duas reuniões, uma no próprio Banco do Brasil e outra na casa do Fagner com a presença, além de Fagner, da Marta, sua irmã, Maninha Morais e o grupo técnico do Banco do Brasil.

Nesse mesmo dia, Fagner me relatou um problema que estava acontecendo também no Açude Orós e que estaria prejudicando a produção do pescado. De imediato fomos estudar a situação e organizamos uma ação integrada que foi o primeiro trabalho de auditoria ambiental no Estado do Ceará.

Com o apoio do Secretário Ednílton e de Fagner, nós nos deslocamos para Orós para estudar o problema. À época, vale ressaltar, a enorme colaboração que tive do meu primo Fabio, engenheiro de pesca, com mestrado no Canadá e doutorado na área na Inglaterra. Fabinho, com apoio fotográfico do Neto, fotógrafo e colaborador da SEFAZ, fizeram um trabalho extraordinário da situação técnica do pescado.

Elaboramos um relatório de auditoria para identificar problemas de monopsônio,  que  descaracterizavam  a  possibilidade  de  formação  de um consórcio dos pescadores e incorporamos o relatório do Fabinho. Afora os problemas relacionados a perda da produtividade do pescado de valor agregado, por uso indevido dos pescadores locais no manejo do pescado, ou seja, a devida falta de orientação e suporte logístico.

Fagner cedeu o local e lancha para que Fabinho e Neto pudessem percorrer o açude fazer o trabalho, onde realizaram o mapeamento dos problemas de baixa produtividade, armazenamento e distribuição do pescado. Relatório

A ida para Orós foi uma das viagens mais espetaculares que tive na minha vida. Viajamos eu e Fagner diante de um trajeto vocabular de música, literatura, economia, futebol e a formação da Fundação.

No meio do caminho, comecei a conhecer a profunda dimensão do cidadão Raimundo Fagner, àquele que está atento em “iluminar o grito das crianças”!

Fagner parou numa humilde casa próximo ao Açude Castanhão (a casa hoje foi tomada pelas águas do Açude e a família mora na Cidade criada – Nova Jaguaribara).

Fagner desceu do carro, abriu o porta-malas e tirou uma enorme sacola com livros e brinquedos, dentre os brinquedos havia um carrinho, protótipo da Ferrari, que ele brincou dizendo que “só o Shumacher” tinha uma ferraria parecida.

Fomos até a casa e encontrei uma criança tetraplégica e a mãe. Conversamos com ela, Fagner deixou os presentes, aproveitou o momento para também ajudar a família e quando saímos ele me contou a história que nas suas idas e vindas para Orós, acostumou parar no local e se afeiçoou a família e acabou apadrinhando o garoto e a família. Fagner inclusive me falou que o outro irmão do garoto não estava pois, todos os dias a avó o deixava e o buscava na escola, distante uns 2 km do local.

Pelo retrovisor, horizontes e fronteiras são iguais, mas Fagner soube olhar à frente e constituiu e fortaleceu a Fundação que iluminou o horizonte e a perspectiva de mais de 15 mil crianças nesse período de maioridade dos 21 anos da Fundação Raimundo Fagner.

Nessa trajetória tive a oportunidade de acompanhar os trabalhos de Fagner e da Fundação e, invariavelmente, estava me encontrando com o Fagner ou com o êxito da Fundação.

Certa vez, quando morava em estava em São Paulo, Totonho me convidou para um show do Fagner no Sesc Pompeia, outro momento excepcional onde renovamos os laços de amizade e admiração.

Hoje, na Secretaria de Finanças e Planejamento do Eusébio, reencontro a Fundação Raimundo Fagner e estamos construindo um programa de educação fiscal e cidadania, com a Secretaria de Educação do Município, a Escola Estadual de Educação Profissional Eusébio de Queiroz a Empresa Três Corações e a Fundação Raimundo Fagner, onde estamos atuando de forma intensa com a virtude dos alunos da Fundação para implementarmos projetos que fortaleçam a cidadania e a educação fiscal no município do Eusébio.

Esta narrativa faz parte de uma breve trajetória em que a “política pública constrói a política” e nesse aspecto, importa mencionar atores que foram e são fundamentais para entender as boas práticas e o fortalecimento das responsabilidades gêmeas – fiscal e social. Dr. Ednílton, como secretário da Fazenda, e Acilon Gonçalves, como Prefeito do Eusébio. Sem apoio deles estes projetos não teriam gerado o resultado e a minha integração.

Substancialmente o papel do Fagner que, para mim é um sujeito, que conseguiu ver no retrovisor da vida e olhar o pára-brisa da frente e oferecer toda sua dedicação para continuar iluminando o grito das crianças.

De minha parte, a gratidão e oportunidade que tive de formular, executar e aprimorar as políticas públicas, bem como integrá-las em outras dimensões , que fortaleceram as políticas públicas a partir da ação coletiva.

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