Por Angela Barros Leal
Se você colocar um mapa do Ceará em posição para um treino de tiro ao alvo, ou para um campeonato de lançamento de dardos, mirando o centro do estado, caso seja firme sua mão, aguçado seu olho e hábil sua pontaria o disparo acertará uma cidade chamada Quixeramobim. Que poderia ter sido a capital do Ceará.
Pelo menos no que dependesse do deputado João Paulino, que em 11 de outubro de 1892 apresentara tal projeto à Assembleia Provincial. Guiava-se ele, em primeiro lugar, por seu amor à “heroica cidade” na qual nascera e, em segundo, pela qualificação dela para o cumprimento de tal papel: era servida pelos trilhos do trem, baseava na agropecuária sua produtiva economia, contava com um telégrafo e um hipódromo, estando prestes a receber o serviço telefônico, possuía reservas de água potável, e era habitada por 13 mil cidadãos, um dos quinze mais populosos municípios do estado.
Gozações, chacotas e graçolas despencaram sobre o Deputado, que aguardava paciente, com a resposta pronta. Atentassem os nobres colegas para a localização central de Roma e Madrid. Para a localização defensiva de Paris, de Bruxelas. A posição estratégica de Washington. Da Cidade do México. De São Paulo. No caso de Quixeramobim, que percebessem o distanciamento harmonioso a separar a nova capital de qualquer outro município cearense, equilibrando assim as atenções devidas a todos.
E que não sofressem os colegas de misoneísmo, palavra cunhada por Cesare Lombroso para qualificar o ódio contra tudo aquilo que é novo. “Isto posto”, concluíra o Deputado, “sentar-me-ei crente de que o mesmo projeto será um dia Lei do Estado, ainda que não possa saber quando isto terá de realizar-se.”
Claro que o projeto se desfaria em pó, nos escaninhos do esquecimento. De qualquer forma, restou o registro do sonho desse que era avô do meu avô, João Paulino de Barros Leal, antecipando em quase sete décadas a lógica para a construção de Brasília. A ideia dele, gestada nas longas noites de Quixeramobim, o coração do Ceará, nascera cedo demais.