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As falácias sobre o IPVA-CE

Antônio de Pádua Marinho Monte é Advogado Tributarista em Fortaleza/CE. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Bacharel em Direito e em Ciências Contábeis.

Por Antônio de Pádua Marinho
Muito se divulgou na imprensa falada, escrita ou virtual, que o IPVA 2018 no Estado do Ceará sofreria uma redução média de 4,46% se comparado aos valores lançados no ano passado (2017).
Ora, a informação é das mais inverídicas possíveis, além de tendenciosa. Na verdade, se considerarmos que veículo algum sofreu uma desvalorização de apenas 4,46% do ano passado para este ano, sendo a real desvalorização muito maior do que referido percentual, o imposto teve foi um aumento para 2018. Explico…
Como se sabe, a depender da marca ou modelo, motorização, tipo de combustível etc., o veículo usado sofre uma desvalorização muito, mas muito maior, do que estes quatro pontos percentuais e meio representam e que foram rotulados enganosamente como uma “generosidade” do governo estadual.
Exemplificando: será que existe alguém que, ao adquirir um veículo em janeiro de 2017 e pagando a importância principal (sem eventuais acréscimos de financiamento) de 100 mil reais pelo modelo, conseguiria vendê-lo em janeiro de 2018 por 95.500 reais. Pois bem, estes quatro mil e quinhentos reais de ínfima perda representaria – hipoteticamente – o percentual de decréscimo que o governo estadual anunciou que, de forma “graciosa”, estaria concedendo aos proprietários de veículos, a título de redução do valor do IPVA para 2018.
Sem a pretensão de aqui lecionar Direito Tributário, mas o valor venal de um veículo representa a base de cálculo do imposto estadual em análise, de forma que esta deverá refletir necessariamente seu valor de mercado. Portanto, não houve redução, mas sim, insuficiente ajuste negativo do valor do bem ao valor de mercado – adjetivo de “insuficiente” eis que veículo algum sofreu uma redução ínfima como essa (de apenas 4,46%), representando – na prática – essa insuficiência um aumento de tributo disfarçado de diminuição, eis que a desvalorização do bem de um ano para outro não foi considerada em sua integralidade para efeitos de determinação da base de cálculo do IPVA (valor de mercado do bem para 2018).
Desmistificada a falaciosa “redução”, outro ponto que merece destaque, para quem não sabe e estranhou há algum tempo ter sofrido “aumento” de IPVA, embora seu veículo tenha se desvalorizado de um ano para outro, é o percentual (alíquota) aplicável ao valor de mercado do veículo.
Além da base de cálculo (valor venal do veículo), outro fator repercute diretamente no cálculo final do IPVA: a alíquota (percentual que será multiplicado ou aplicado na base de cálculo, para fins de determinar o valor final do tributo).
No Ceará, desde março de 2016, por conta da lei estadual n.º 15.893 (DOE 27.11.2015), as alíquotas de IPVA são crescentes (“progressivas”) em função da quantidade de cavalo-vapor (CV) do veículo (potência).  Isto quer dizer, por exemplo, que um veículo com potência entre 100 e 180 cv será tributado por uma alíquota de 3,0%  e um veículo com potência acima de 180 cv a uma alíquota de 3,5%.
De certo, a intenção do idealizador da norma foi a de tentar alcançar a capacidade contributiva do proprietário do veículo (art. 145, §1º, CF/1988). No entanto, a norma além de equivocada em seu elemento teleológico, não encontra amparo algum na Constituição Federal, a qual apenas permite alíquotas diferenciadas de IPVA em função do tipo de uso ou do tipo de veículo (art. 155, §6º, II) e nada mais, além disto.
A ressalva constitucional no que concerne ao “tipo de uso” ou “tipo de veículo”, advirta-se, diz respeito unicamente a este ser “de passeio”, “utilitário”, “utilitário esportivo” ou “SUV”, transporte de passageiros, transporte de cargas, automóvel, etc. Em nada diz respeito, portanto, à  sua motorização ou potência.
É igualmente equivocado o raciocínio, pois veículos usados mais potentes não serão, necessariamente, mais valiosos e pertencentes a pessoas mais abastadas (refiro-me, exclusivamente, a veículos usados); muito pelo contrário: seus valores despencam a cada ano, tornando-se até mesmo, de certa forma, convidativos para as demais camadas sociais, embora estejamos em tempos de aumentos semanais nos preços dos combustíveis líquidos.
Por fim, não menos grave, é a falta de remessa postal do boleto anual de IPVA impresso para o domicílio dos contribuintes. Em que pese a medida (meramente administrativa) possa representar uma redução “milionária” de despesa pública com impressão, remessa postal etc, a ausência da postagem torna irregular a cobrança do imposto, conforme entendimento já sedimentado por nosso Superior Tribunal de Justiça (Súmula 397). É que, conforme o Tribunal da Cidadania, o lançamento de impostos como IPVA e IPTU, necessariamente, se completa, se aperfeiçoa, ganhando contornos de exigibilidade, com a remessa postal para o endereço do contribuinte, equivalente à necessária NOTIFICAÇÃO de lançamento.  Sem ser notificado do lançamento, o contribuinte não pode ser considerado “inadimplente”, da mesma forma que uma lei, sem a necessária publicação, não poderá ser exigível.
Nosso Estado do Ceará se mantém, já há algumas décadas, na vanguarda da criatividade arrecadatória, embora que permaneça na retaguarda, quando o assunto é respeito aos direitos e garantias fundamentais dos contribuintes.
 

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