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O indulto natalino de Bolsonaro, por Marcelo Sidrião Salgado

Marcelo Sidrião F. Salgado. Cientista Politico e Especialista em Psicologia Jurídica. Consultor de Empresas e Professor da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Sócio da MS Consultoria e Pesquisa. Escreve mensalmente no Focus.jor. E-mail: msconsultbr@gmail.com

Marcelo Sidrião Salgado
Post convidado

A clemência é bíblica e encontra fundamentos na lei mosaica, no cristianismo, budismo, judaísmo e hinduísmo. Na Grécia antiga o perdão foi frequentemente utilizado como ferramenta política. Na Inglaterra foi usado para consolidar o poder dos reis e rainhas. Nos Estados Unidos, o poder de perdoar os delitos também foi usado politicamente por diversos presidentes.

Na Constituição de 1824, o Imperador exercia o poder moderador e tinha a capacidade de perdoar ou moderar as penas impostas aos réus no Brasil condenados por sentença. Com o advento da República, a Constituição de 1891, reservou como competência privativa do Presidente, o poder de indultar e comutar as penas. Tradição mantida até os tempos atuais.

A Carta Magna de 1988 prevê, em seu art. 84, inciso XII, competir privativamente ao Presidente da República conceder indulto e comutar penas, consultando, se necessário, dos órgãos instituídos em lei. Juntamente com a anistia e a graça, o indulto encontra-se entre as causas extintivas de punibilidade constantes do art. 107, II, do Código Penal.

Em Portugal e no Brasil, os indultos concedidos pelos Presidentes em exercício, costumam acontecer às vésperas do Natal. Manda a tradição que podem ser beneficiados pelo indulto natalino, os detentos de bom comportamento, os portadores de doença grave e aqueles que não condenados por crimes hediondos, tráfico de drogas e praticados com violência ou grave ameaça.

Como prometido nos últimos meses, o presidente Jair Messias Bolsonaro, assinou o Decreto Nº 10.189, em 23\12\2019, que concedeu indulto a agentes de segurança pública que tenham sido condenados por “excesso culposo” ou “legítima defesa”. O texto foi construído em conjunto pelo Ministério da Justiça e o Palácio do Planalto. O indulto humanitário natalino de 2019, além dos portadores de paraplegia, tetraplegia, câncer, AIDS e cegueira também beneficiou os agentes públicos que compõem o sistema nacional de segurança pública, nos termos do disposto na Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018, que, até 25 de dezembro de 2019, no exercício da sua função ou em decorrência dela, tenham sido condenados.

O decreto perdoou militares das Forças Armadas atuantes em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) A norma também inclui policiais federais e estaduais, que cometeram o crime “no exercício da função ou em decorrência dela”.  Bolsonaro aqui reforça a defesa da tese de excludente de ilicitude, para evitar que policiais e militares sejam punidos por crimes ocorridos durante confrontos. Na prática, um policial atacado por criminosos que tiver reagido com excesso e matado os agressores poderá receber o benefício se não tiver sido provada a intenção. Policiais e militares condenados por crimes dolosos não serão beneficiados pela medida.

Essa é a primeira vez na história do Brasil que o indulto natalino é destinado a uma categoria específica. O instituto não pode ser dirigido a pessoas específicas, mas, sim, a todos os condenados que, na data da publicação, atendam aos requisitos. O indulto presidencial de 2019, não abarca condenados que tenham praticado infrações disciplinares graves ou que tenham descumprido as regras fixadas para a prisão-albergue domiciliar ou para o livramento condicional.

O indulto natalino entretanto, de acordo com o decreto, não será concedido às pessoas que: tenham sido incluídas no regime disciplinar diferenciado em qualquer momento do cumprimento da pena e que tenham descumprido as condições estabelecidas para a prisão-albergue domiciliar, com ou sem monitoração eletrônica, ou para o livramento condicional, observados os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Os condenados beneficiados não deixarão a cadeia imediatamente. A extinção da punibilidade através do indulto pode ser determinada pelo juízo da execução de ofício, ou atendendo a requerimento da Defensoria Pública, da Defesa, do Ministério Público, do Conselho Penitenciário, ou mesmo do próprio apenado.

O objetivo do presidente com a medida é agradar suas bases eleitorais. Seus antecessores fizeram o mesmo. Em 2017 por exemplo, o coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, procurador Deltan Dallagnol, disse que o decreto de Michael Temer era um  “feirão de natal para corruptos”. Na época procuradora-geral da República, Raquel Dodge, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal para suspender os efeitos do decreto. 

A ampliação da aplicação do indulto natalino para corrigir superlotações é um sintoma da paralisia estatal brasileira na construção de unidades prisionais adequadas para o sistema progressivo. Essa generosidade excessiva não faz bem como política de prevenção e combate ao crime.

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