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O escasso processo legislativo na lei do piso nacional da enfermagem. Por Frederico Cortez

Frederico Cortez é advogado, sócio do escritório Cortez & Gonçalves Advogados Associados. Especialista em direito empresarial, direito digital e propriedade industrial. Cofundador da startup MyMarca- Propriedade Industrial & Intelectual. 

Por Frederico Cortez

A Lei 14.434/22 que instituiu o piso salarial nacional para os profissionais da enfermagem sofreu uma reviravolta na manhã de hoje, quando o então ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal (STF) emitiu uma decisão liminar suspendendo os efeitos da nova lei. De acordo com a Lei 7.498/86 que regulamenta o exercício do profissional da enfermagem, o art. 15-A inova com o valor do piso a ser pago no montante de R$ 4.750,00. Desse montante, deriva-se aumento também para os profissionais de técnico e auxiliar em enfermagem e parteiras.

A controversa levantada pelos que questionam o piso nacional da enfermagem se ancora na alegação de que não houve realização de audiências públicas, quanto ao custeio da aplicação do novo salário para a categoria da saúde e demais resultados da nova Lei. Inobstante ao mérito da aguerrida classe de enfermeiros e enfermeiras de todo o País, há um ruído em relação à escassez da audiência pública para um tema tão importante e que traz um grande impacto financeiro para hospitais, clínicas e casas de saúde de todo o Brasil.

O processo legislativo tem a realização de audiências públicas como uma de suas fases na construção de uma lei. A justificativa tem seu amparo na Constituição Federal de 1988 em seu art. 58, §2º e incisos II e IV, com o garantismo da presença da sociedade e assim também ser ouvido o outro lado, na forma constitucional do contraditório e ampla defesa. Aqui, avalio que houve um atropelo por não ter concedido o necessário espaço para as entidades e empresas de saúde ligadas à hospitais, clínicas e casas de saúde. Não se trata somente de empresas privadas, pois é bom lembrarmos que as casas de saúdes são entidades filantrópicas e não imunes ao pagamento do novo piso nacional da enfermagem.

No mais, há que se ter respeito ao princípio da não surpresa também na elaboração e aprovação de projeto de lei. Imperioso destacar que o Congresso Nacional é uma “casa de debates” e não uma tenda de aprovações de vontades políticas em ano eleitoral. A classe de enfermeiros e enfermeiras merece toda atenção, respeito e prestígio, e que essa decisão do ministro Luís Roberto Barroso não é de toda sorte ruim para essa respeitosa categoria de profissionais. O STF está tão apenas suprindo uma lacuna não preenchida, pelo processo legislativo da Lei do piso nacional da enfermagem, para justamente não ser declarada uma lei inconstitucional mais à frente. Aqui sim, o prejuízo seria enorme e irreversível.

Ao consultar a Lei 14.434/22 que apresenta um vultoso impacto financeiro para municípios, estados, hospitais, clínicas e casas de saúde, não se vislumbra qual a fonte de custeio para toda essa inovação. O açodamento na provação de tal Projeto de Lei que derivou na Lei do piso nacional da categoria de enfermagem abriu espaço para seu questionamento do ponto de vista do processo de legislação. Em sua decisão liminar, o ministro Barroso enfatiza o impacto da nova lei em diferentes entes federativos, causando assim um desequilíbrio nas contas contas públicas, como segue: “A comparação entre os novos pisos e a média salarial praticada nas unidades da Federação evidencia que, no estado de São Paulo, o aumento salarial necessário para o atingimento do novo piso dos enfermeiros seria de apenas 10%, enquanto, no estado da Paraíba, o aumento seria de 131%. No caso dos técnicos de enfermagem, as entidades hospitalares do estado de São Paulo atingiriam o piso com um aumento de 40% em sua média salarial; no estado da Paraíba, seria necessário um aumento de 186% “.

A audiência pública é uma ferramenta constitucional que faz parte do Estado Democrático de Direito, que se traduz numa intervenção republicana de terceiros interessados na matéria de fundo da nova lei a ser construída. Vedar a realização de audiências públicas para a Lei do piso nacional da enfermagem foi um risco calculado e conhecido por todos ali que faziam parte da comissão especial na Câmara dos Deputados. De certo que, todos os profissionais da enfermagem merecem nosso respeito e deve ter sim nosso total apoio na construção de melhorias de trabalho.

O instituto da “audiência pública” tem a sua função precípua de tornar público o tema em discussão, assim como receber sugestões, questionamentos, petições e documentos de todos os lados para ao fim formar um parecer, se a favor ou contrário à aprovação da nova lei. Fora isso, é jogar para a plateia e “brincar” com um tema tão sensível e importante, criando e frustrando expectativas para as pessoas mais interessadas na aprovação do Projeto de Lei. Aqui já registro meu opinamento a favor dos profissionais da enfermagem, que sempre estão na linha de frente da saúde de todos nós, e que desta vez todos os envolvidos nesse processo sejam ouvidos e que encontrem uma solução definitiva para a questão do custeio da lei do piso nacional da enfermagem.

Fato é que a lei não foi julgada inconstitucional pelo STF, tão apenas terá que se cumprir o que determina a Constituição Federal de 1988. O campo de debates é essencial para a propositura e aprovação de novas leis, não devendo ser suprimido, sob pena de ter a intervenção do Poder Judiciário na sua missão de fiscalizador e aplicador da lei. Como agora se amolda ao presente caso.

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