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Lula agora investe em agendas com empresários enquanto ataca o mercado

Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Equipe Focus
focus@focus.jor.br

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entrou em uma nova fase da pré-campanha pelo Palácio do Planalto e passou a encontrar agentes econômicos em jantares. Ao mesmo tempo, em público, o petista mantém ataques ao mercado, às privatizações, à reforma trabalhista e ao teto de gastos – regra fiscal que limita o crescimento das despesas públicas à inflação. A princípio fechado para reuniões com empresários e banqueiros, como mostrou o Estadão, Lula agora investe na aproximação com o chamado PIB – o grupo de atores dos principais setores da economia brasileira.

Os primeiros encontros se deram nas duas últimas semanas. O movimento, porém, ainda enfrenta resistência no empresariado, sobretudo em virtude de posicionamentos econômicos que remetem, não ao primeiro mandato de Lula (2003 a 2006), quando o governo entregava superávit primário ao arrecadar mais do que gastar, mas à gestão de 2006 a 2010 e às administrações Dilma Rousseff (PT). Nesse período, houve deterioração das contas públicas e inchaço da máquina, por exemplo.

A partir deste mês, o foco, segundo articuladores, é dialogar com federações da indústria, do comércio e do agronegócio. O encontro mais emblemático, na palavra de um dirigente da campanha, é o jantar que será realizado amanhã na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Na próxima semana, Lula pretende se reunir com dirigentes da Confederação Nacional do Comércio (CNC), durante viagem a Brasília.

Para pessoas próximas do petista, é “questão de tempo” até que ele tenha dialogado com os setores relevantes da economia, especialmente se seguir na dianteira das pesquisas de intenção de voto. De acordo com cientistas políticos, as conversas com o empresariado associadas às críticas recorrentes ao setor integram uma estratégia de Lula de emitir sinais a uma parte da sociedade mais ao centro sem desagradar aos eleitores mais à esquerda.

Nas atuais conversas, Lula não entra em detalhes sobre medidas de um eventual futuro governo, tampouco anuncia um interlocutor único para tratar do plano econômico, como cobram empresários. Em vez disso, ele prefere reforçar uma tríade: promessa de crescimento, compromisso de pacificação do País capaz de atrair investimentos e a memória de seus governos passados, que, segundo ele, é a prova de que está disposto a governar com apoio do empresariado e com responsabilidade fiscal.

Aos empresários, o petista tem criticado medidas consideradas eleitoreiras do governo Jair Bolsonaro (PL). Está nessa lista, por exemplo, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC), aprovada pelo Senado na semana passada, que turbina benefícios e eleva gastos em R$ 41,25 bilhões em ano eleitoral. Senadores do PT e aliados de Lula em outras legendas, no entanto, votaram a favor.

Em público, anteontem em ato em Salvador, o petista afirmou que o eleitor tem de “pegar todo o dinheiro” e não votar em Bolsonaro, além de criticar reiteradamente a política de preços da Petrobrás.

Antes da nova fase, o ex-presidente já havia recebido os empresários Abilio Diniz, da Península Participações, e José Seripieri Jr., da QSaúde. Em junho, esteve em um jantar com a presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Teresa Vendramini, e Pedro Passos, fundador da Natura, que tem discurso crítico às diretrizes do plano de governo apresentado pelo PT. Encontrou ainda nomes como Claudio Ermírio de Moraes (Votorantim), Frederico Trajano (Magalu) e Carlos Sanchez (EMS).

“O saldo final dessas reuniões tem sido positivo. Havia disposição recíproca de dialogar. Lula mostrou que não é um bicho-papão, pelo contrário”, afirmou o advogado Marco Aurélio Carvalho. Além de ser coordenador do Grupo Prerrogativas, ele é um dos nomes mais próximos a Lula hoje e ajudou a organizar dois dos três mais recentes jantares entre o ex-presidente e empresários.

No agronegócio, contudo, já há rachas. A presença de Teresa, da SRB, no jantar com Lula gerou ruído na entidade. A dirigente passou a ser alvo de questionamentos e críticas por ter dividido a mesa com o petista no evento organizado pelo fundador do Insper, Cláudio Haddad. Nessas incursões, o petista conta com o candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB), para destravar relações, sobretudo com esse setor.

“Gostando ou não pessoalmente do presidente Lula, os agentes financeiros, atores econômicos, inclusive do mercado, sabem que só a chapa Lula-Alckmin pode reconstruir planejamento, previsibilidade e segurança, para que os investimentos possam chegar ao Brasil”, disse o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), que tem sido enviado por Lula como um dos emissários para falar sobre os planos econômicos.

Apesar do tom otimista do entorno do ex-presidente, empresários se mantêm reticentes. Outros fazem críticas aos governos petistas e aos posicionamentos adotados por Lula, inclusive nas diretrizes do plano de governo. Em entrevista na sexta-feira à Rádio Metrópole, da Bahia, o petista usou, por exemplo, o termo “imbecil” para se referir a banqueiros.

Por outro lado, a recepção na Fiesp será carregada de simbolismos. Na presidência da entidade está Josué Gomes da Silva, filho do vice-presidente José Alencar, morto em 2011, que foi um dos avalistas de Lula junto ao empresariado na eleição de 2002. A entidade apoiou os protestos contra o governo Dilma, cruciais para o caldo político que levou ao impeachment da ex-presidente.

Para o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o posicionamento de Lula – ao investir em conversas com agentes econômicos, mas manter críticas a temas sensíveis ao setor – faz parte de uma estratégia política que já deu certo para o petista. O professor relembra a “criação” do “Lulinha paz e amor”, uma roupagem que garantiu a vitória em 2002.

Segundo Prando, Alckmin é o fiador dessa estratégia nesta eleição. “Ele traz a ideia de um diálogo com o centro, com Alckmin, com o mercado e com o empresariado, mas sabe que não pode abandonar, como Bolsonaro nunca abandonou, sua base mais fiel”, disse.

Já o cientista político José Álvaro Moisés, professor da Universidade de São Paulo, considera que o petista adota “uma posição que se poderia chamar progressista mais radical”. “Lula tem insistido na questão de que mais importante do que o ajuste fiscal no Brasil seria o ajuste social”, afirmou. Do ponto de vista de Lula, Moisés diz não haver incoerência em abordar esses temas e sentar para conversar com o mercado. “Quando vai se encontrar com o mercado, ele vai apresentar essas questões e tentar justificá-las.”

Agência Estado

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