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Invisibilidade política da mulher nos sites dos partidos. Por Raquel Cavalcanti e Vitória Olinda

Raquel Cavalcanti Ramos Machado (professora de Direito Eleitoral da UFC, membro do ICED, da ABRADEP, Coordenadora do Grupo Ágora – Educação para a cidadania)
Vitória Olinda Barros (Pesquisadora da UFC e Coordenadora digital do Grupo Ágora – Educação para a cidadania).

Equipe Focus
focus@focus.jor.br

Numa democracia, o efetivo diálogo entre os cidadãos, e entre cidadãos e instituições é um pressuposto para a compreensão e a legitimação das mais diversas tomadas de decisões. Ainda que se admita a figura das candidaturas independentes em alguns regimes democráticos, é inegável que atualmente é no seio de partidos políticos e de associações semelhantes que são pensadas a maioria das candidaturas políticas, e apresentadas as ideias motoras do debate político.

Partidos políticos não existem apenas para si ou para seus filiados, existem para articular interesses participando direta ou indiretamente do poder. Dessa forma, enquanto meio de divulgação de pautas e ideais, a propaganda é do interesse dos partidos, dos filiados, e também do povo, que passa a conhecer as aspirações de cada agremiação. Por esse motivo, durante longo período da história do Direito Eleitoral brasileiro, foi assegurado aos partidos políticos tempo gratuito de propaganda no rádio e na televisão.

Porém, em razão de questões econômicas relacionadas a instituição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha após a proibição das doações de campanha por pessoas jurídicas, associadas a mudanças na forma de comunicação em sociedade, principalmente diante da gradual expansão do acesso à internet, a Lei nº 13.487/17 revogou as disposições da Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.906/95) que previam a transmissão de propaganda partidária gratuita no rádio e na televisão, observado o tempo mínimo de 10% para a promoção e difusão da participação política feminina.

Após a alteração legislativa, sem propaganda gratuita no rádio e na televisão, os partidos não deixaram de dialogar com os cidadãos. Eles passaram a utilizar mais intensamente sites próprios e as redes sociais, nos quais podem divulgar suas ideias e ações. Esses canais de comunicação, porém, não receberam regulamentação, sobretudo quanto ao espaço que deve ser dedicado a incentivar a participação das mulheres na política, assim como o destaque que deve ser dado às filiadas.

Curiosas sobre a questão, fizemos pesquisa para verificar como a pauta da participação feminina é desenvolvida pelos partidos no ambiente digital, especificamente no âmbito dos sites partidários, tendo sido constatado que:

a. nove dos trinta e três sites disponíveis não possuem seção específica acerca dos direitos das mulheres;

b. os vinte e quatro que possuem apresentam resultados extremamente díspares quanto à facilidade de acesso à informação, à existência de texto explicativo acerca da importância da participação política das mulheres (62,50% não apresentam), à descrição da atuação do partido nesse âmbito (54,17% não apresentam) e à transparência quanto à atuação e composição de núcleo temático, se existente (54,17% não apresentam).

Ou seja, nesse veículo de comunicação dos partidos, não há ambiente digno para a participação da mulher. Digno no sentido objetivo dado pela legislação brasileira, que possui diversas normas mandatórias de proteção de um percentual mínimo de participação da mulher na política, tendo a Justiça Eleitoral, cada vez mais, se posicionado no sentido de que a democracia intrapartidária deve ser um referencial para a democracia que se busca experienciar, em último plano, nas próprias bases estatais.

Portanto, diante da revogação da propaganda partidária gratuita no rádio e na televisão e da disparidade constatada na ausência de norma reguladora da propaganda partidária veiculada nos sites dos partidos, diante também da necessidade de comunicação dos partidos com os cidadãos, de se respeitar e incentivar a participação da mulher na política, e ainda do fato de que, na contemporaneidade, a comunicação se dá sobretudo no espaço digital, conclui-se que o disciplinamento da propaganda partidária nesse âmbito é plenamente justificada e necessária para a promoção da participação política da mulher, diretriz presente no ordenamento jurídico brasileiro e que deve ser observada.

Sendo esse diálogo essencial em uma democracia, e tendo sido verificado que alguns partidos políticos sequer tratam da temática em seus sites, ignorar a questão é negar às mulheres um espaço apropriado de comunicação. Deve-se reservar uma seção específica que garanta a elas acesso facilitado a informações bem estruturadas e coesas, assim como faz-se necessário realizar comunicações voltadas à participação feminina no poder. Não se pode falar em democracia digital, nem em democracia partidária sem dar voz adequada à mulher nos sites partidários.

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