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Esboço de uma política de desenvolvimento orientada pelo mercado social para o Nordeste, por Pedro Sisnando

Pedro Sisnando Leite é economista com pós-graduação em desenvolvimento econômico e planejamento regional em Israel. Membro do Instituto do Ceará e da Academia de Ciências Sociais do Ceará. É professor titular (aposentado) do programa de mestrado (CAEN) da UFC, onde foi também Pró-Reitor de Planejamento. No Banco do Nordeste, ocupou o cargo de economista e Chefe da Divisão de Estudos Agrícolas do Escritório Técnico de Estudos Econômicos. No período de 1995-2002, exerceu a função de Secretário de Estado de Desenvolvimento Rural do Ceará. Publicou cerca de 40 livros em sua área de especialização e escreveu muitos artigos para jornais e revistas.

As políticas para o desenvolvimento do Nordeste nas últimas décadas não alcançaram os seus objetivos de progresso e melhoria das condições de vida dos milhões de habitantes dessa Região que trabalham e esperam há séculos por uma condição de vida condigna e feliz. Não há justifica política, ideológica ou quaisquer que sejam para isso. Há meio século tenho vivido, estudado, ensinado e trabalhado para ajudar, mesmo que modestamente, para mudar essa situação da qual sou originário. Hoje, agora que escrevo esta Crônica, só tenho uma certeza, se a governança desse País não mudar o que vem acontecendo em relação ao passado, estamos condenados ao subdesenvolvimento industrializado, pobre e desigual com todos as consequências sociais que ninguém deseja como ocorre em outros países da América Latina.
O subdesenvolvimento do Nordeste é atribuído a diversos fatores históricos, econômicos, internacionais, políticos, de dotação inadequada de recursos naturais, além de limitantes culturais e sociais. Torna-se difícil, contudo, distinguir entre os fatores causais e os efeitos do próprio atraso econômico e social da região.

A concepção dominante da política econômica para o Nordeste tem sido a obtenção de acelerado crescimento da renda, com o objetivo de diminuir as disparidades de desenvolvimento entre esta Região e outras mais prósperas, especialmente o Sudeste. Os resultados obtidos nesse particular são significativos, mas modestos em face dos esforços e montante de investimentos realizados. Têm sido insuficientes as conquistas no campo econômico, social e da melhoria das condições de vida da população pobre.

Estratégias para o desenvolvimento do Nordeste

Estudos realizados pelo Banco do Nordeste do Brasil, por eminentes professores da Ben-Gurion University (Israel) Raphael Bar -El, Dafna
Schwartz, David Bentolila e outros, e pelo autor desta Crônica, identificaram também outras graves dificuldades da economia nordestina que exigem urgente solução. As mais agudas nesse particular são: a) existência de níveis demasiadamente elevados de desemprego e subemprego, aliados a baixa produtividade no setor agrícola e processo de emigração do campo para as zonas metropolitanas; b) extensa proporção de pobreza absoluta e amplo hiato de padrões de vida entre a população do Nordeste e do Sudeste do país; c) excessiva concentração de renda nos centros urbanos industrializados em relação às zonas rurais e por categorias sociais em ambas as áreas; d) falhas na execução das políticas econômicas para a região e falta de controle dos programas de desenvolvimento regional; e) problemas sociais de habitação inadequada, alimentação deficiente, saneamento e baixos padrões de educação e de saúde pública, em relação às regiões mais desenvolvidas.

Diante dessas constatações, verifica-se que o empenho em obter o desenvolvimento regional não tem resultado no atendimento do duplo objetivo de crescimento econômico suficiente e benefícios sociais para a sociedade nordestina. Não pode haver dúvidas, por isso, de que o problema no desenvolvimento do Nordeste seja prioritário e uma responsabilidade nacional, como condição para o próprio desenvolvimento do País. Muito foi feito, mas o essencial ainda precisa ser realizado.

Parece ilusório, portanto, pretender superar essas dificuldades mantendo a estratégia de desenvolvimento até agora seguida. Há necessidade de uma mudança de ênfase nos objetivos, bem como na estratégia utilizada. Aperfeiçoar ou criar também os instrumentos de política econômica para a região como poderia ser conduzida por uma no nova SUDENE a ser reestruturada. Ao Banco do Nordeste cabe um papel estratégico nesse sentido por motivo de seu papel de agência de desenvolvimento regional e sua capacidade técnica e financeira. O Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Banco do Nordeste precisa ser revitalizado em suas funções de estudos práticos e planejamento, descaracterizada a partir do Governo FHC. Fui economista-chefe substituto desse órgão na administração do Presidente Raul Barbosa e considero essa orientação nefasta para o BNB e a Região, é o que dizem todos que conhecem o assunto. Como Vice-Presidente do Instituto Econometrix, que congrega muitos técnicos pioneiros da história desse banco, temos procurado reanimar essa questão sem êxito. Parece que o Ministro Paulo Guedes não tem conhecimento sobre o assunto.

A tarefa de superação do subdesenvolvimento, naturalmente, depende da solução de alguns problemas básicos, além da mera pretensão de aumento da renda e de outros indicadores gerais. Podem ser citadas, para melhor esclarecer essas questões vitais para o êxito do projeto de desenvolvimento do Nordeste: a) aumento acentuado de produtividade agrícola, com simultânea criação de emprego não agrícola do quadro rural, para absorver a mão de obra liberada pela modernização do setor; b) orientação das políticas para dar ênfase à redução do desemprego e subemprego, através da pequena e média indústria e outras atividades empregadoras; c) direcionamento da economia com vistas à disseminação espacial dos benefícios do desenvolvimento, com ênfase nas zonas rurais onde se encontram os maiores focos de atraso econômico e social. Os recursos dos governos federal e estadual, associado à contribuição do setor privado local, deveriam ser canalizados para a solução desses reais problemas da Região. Com isso, advirão benefícios para a economia nacional quanto à criação de uma economia fortalecida e gradativamente autossustentada, reduzindo a necessidade futura de transferência de recursos para a região. Um Nordeste mais desenvolvido fortalece o sistema político nacional pela redução das pressões sociais que a pobreza fomenta (O verdadeiro desenvolvimento econômico, Sisnando, Fortaleza, LCR,2009).

Desse modo, torna-se necessário explicitar claramente na política econômica regional os problemas centrais a serem atacados. Com essa orientação, será mais fácil ajustar todas as diretrizes e instrumentos de atuação, evitando a disseminação dos escassos recursos em problemas sem prioridade para o autêntico desenvolvimento econômico.

Ajuste dos Rumos para o Desenvolvimento do Nordeste

Os objetivos para o desenvolvimento sustentável do Nordeste para os próximos anos deveriam ser de crescimento o mais acelerado possível da renda, buscando resultados econômicos, sociais e ambientais. Focar na modernização da agricultura com base na unidade familiar e no apoio à empresa agrícola onde se tornar necessário; fortalecimento do setor industrial moderno, reorganização das empresas tradicionais e ajuda às pequenas e médias empresas, especialmente as agroindústrias e indústrias das comunidades do interior, com vista a internalizar os resultados da industrialização.

Para e realização desse projeto é necessário que ocorra um gradativo aperfeiçoamento das instituições regionais e estaduais. O foco deve ser uma atuação coordenada em certas áreas, segundo um método abrangente com base na SUDENE e BNB. Tem de haver uma atitude e disposição para a colaboração dos Governos Estaduais com o Governo Federal. Poderia começar por um conjunto de atividades mais restritas orientadas para a melhoria das condições do público-meta e, progressivamente, para toda a população regional. Em resumo, é um processo segundo o enfoque de desenvolvimento regional integrado (Desenvolvimento Regional Integrado, segundo o enfoque de Rehovot, Sisnando Fortaleza, LCR, 2016).

Um programa para o desenvolvimento do Nordeste não pode ficar restrito a um setor ou medidas isoladas. Intervenções individuais de reforma agrária, modernização tecnológica ou de industrialização, por exemplo, podem surtir efeitos bem abaixo de suas possibilidades se não forem empreendidos conjuntamente.

Na prática, é oportuno relembrar, o desenvolvimento da agricultura é parte do desenvolvimento mais abrangente de todo o espaço rural, o qual, por sua vez, se liga umbilicalmente a todo o processo de desenvolvimento econômico. Do mesmo modo ocorre com as interligações do desenvolvimento industrial e dos serviços.

Dessa constatação, pode-se concluir que a orientação das ações carece de uma nova estratégia que leve em conta a necessidade de um enfoque abrangente e concentrado em localidades prioritárias. “Todas as atividades requerem espaço”, diz John Friedman. Por estas razões, as medidas propostas neste documento precisam ser consideradas numa perspectiva de interdependência e complementaridade para que os resultados econômicos e sociais desses programas possam a ser maximizados.

A estratégia que sugerimos se destina a atacar o problema de subdesenvolvimento de modo multi-setorial, com vistas a reduzir as emigrações rurais para as cidades metropolitanas já congestionadas. A chave desse enfoque é criar oportunidades produtivas nas próprias zonas rurais, inclusive nas pequenas cidades do interior, que devem funcionar como centros de serviços sociais e de apoio à produção.

A metodologia para o desenvolvimento regional deve tomar por base o crescimento econômico, a modernização e o aumento da dimensão econômica das áreas rurais, mediante: a) mobilização dos recursos humanos e melhor aproveitamento dos recursos naturais e de infraestrutura existentes nas áreas de ação prioritária; b) garantia do acesso dos pequenos produtores aos recursos produtivos e aos serviços de suporte necessário à produção; c) criação de oportunidades de emprego com vistas à melhoria da distribuição de renda e do poder de compra da população rural; c) integração da agricultura, indústria e serviços, no próprio quadro rural, levando em conta os aspectos físicos, econômicos, sociais e organizacionais; e) melhoria das condições de alimentação, saúde, educação, habitação e outras necessidades básicas, como requisitos para o aumento da produtividade e qualidade de vida da população.

É importante salientar que o desenvolvimento econômico regional que este documento propõe é mais do que um simples crescimento, mas um processo extremamente complexo do qual compartilham diversas variáveis econômicas, sociais, ambientais, políticas e institucionais. Desse modo, os recursos colocados à disposição de programas de desenvolvimento regional não devem ser alocados sem levar em consideração a interdependência existente entre eles. Ou seja, a estratégia proposta neste artigo é de um desenvolvimento regional integrado, includente e sustentável.

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