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Desenvolvimento do Nordeste do Brasil, por Pedro Sisnando Leite

Pedro Sisnando Leite é economista com pós-graduação em desenvolvimento econômico e planejamento regional em Israel. Membro do Instituto do Ceará  e da Academia de Ciências Sociais do Ceará. É professor titular (aposentado) do programa de mestrado (CAEN) da UFC, onde foi também Pró-Reitor de Planejamento. No Banco do Nordeste, ocupou o cargo de economista e Chefe da Divisão de Estudos Agrícolas do Escritório Técnico de Estudos Econômicos. No período de 1995-2002, exerceu a função de Secretário de Estado de Desenvolvimento Rural do Ceará. Publicou cerca de 40 livros em sua área de especialização e escreveu muitos artigos para jornais e revistas.

O Banco do Nordeste do Brasil foi criado em 19 de julho de 1952, passando a funcionar dois anos depois, segundo um novo  modelo inovador de Agência de Desenvolvimento Econômico  Regional.  Os idealizadores dessa Instituição tomaram por base o entendimento de que não existiam modelos universais para a programação regional e cada situação requer sua própria solução particular.

A criação do Banco do Nordeste foi a mais importante e duradora política do Governo Federal  com vistas ao desenvolvimento regional do País.   A finalidade desta Crônica, portanto, é relembrar   informações gerais que motivaram a criação do Banco e destacar a relevância do seu papel no desenvolvimento regional do Brasil, nem sempre conhecidas ou entendidas pelos políticos e gestores públicos do País, por intelectuais e pelos setores de comunicação social.  Na verdade, muitos historiadores afirmam que não poderemos prever o futuro sem conhecer o passado. Na qualidade de membro do Instituto Histórico e Geográfico do Ceará aprendi como é importante conhecer os fatos e as personalidades  que marcaram a vida das sociedades e dos países.  O meu desejo é destacar mais uma vez que BNB não é um banco qualquer, mas uma Agência de desenvolvimento Regional   sem similar em outros países subdesenvolvidos do mundo até hoje.

Um Pouca da História do Banco do Nordeste

No início da década de 1950, era grande o desalento do Governo Federal e da população do Nordeste com relação aos efeitos das obras de combate às secas, de responsabilidade da Inspetoria e depois Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS).  É bom registrar que foram muitas as realizações desse Órgão em infraestrutura, estudos dos recursos naturais, e construção de açudes.

Para contornar essa situação, nesse mesmo ano, foi aprovada uma Lei de autoria do  deputado cearense Paulo Sarasate   autorizando o Poder Executivo a financiar os particulares  para construírem obras de melhoramento das fazendas contra as secas. Acredito que essa iniciativa foi a chave para a criação futura de uma agência de crédito, pois o Banco do Brasil não tinha capilaridade para executar essa responsabilidade, que passou a ser uma cobrança constante das lideranças políticas da Região.

Quando foi iniciado o Governo do Presidente Getúlio Vargas em 1951, eram grandes as expectativas na nova administração. Para ajudá-lo a preparar um plano de desenvolvimento, o Presidente Vargas criou uma Assessoria Econômica junto ao seu gabinete. Novamente o destino estava favorável ao Nordeste, pois passaram a fazer parte dessa importante  equipe os economistas nordestinos Rômulo Barreto Almeida, Jesus Sores Pereira e Ignácio Rangel, depois Cleantho de Paiva Leite.

Logo nos primeiros meses de 1951, ficou caracterizada mais uma devastadora seca no Nordeste, com perdas de safra, invasões nas prefeituras e reclamações de todos os lados. Depois de uma viagem de observações às áreas afetadas, foi preparado um excelente relatório que serviu de base  para a criação de um banco de desenvolvimento regional. O ministro da Fazenda também foi pressionado por recursos para financiar os fazendeiros, segundo a Lei Sarasate.  Ao regressar de uma visita à Região, para participar de reunião sobre a produção algodoeira, o Ministro Horácio Lafer  propôs a organização de um banco que fosse  “eficiente” e lidasse com recursos limitados.

Em vista desses acontecimentos, o Presidente Vargas diretamente com sua assessoria técnica, coordenada pelo economista Rômulo  Almeida, delineou uma instituição  de crédito  inovadora,  depois de longas discussões  com muitos especialistas  conhecedores da economia brasileira, inclusive Roberto Campos. O princípio fundamental desse novo ente de natureza mista foi limitar o arbítrio dos diretores, admitir um funcionalismo rigorosamente selecionado (treinado e responsável), com planos de ação bem delineados. O Presidente Vargas deu total apoio para que fosse implantado um sistema de mérito, o que foi feito com muito êxito pelos administradores do Banco desde a sua instalação.

A mensagem presidencial para a criação do Banco do Nordeste foi encaminhada ao Congresso Nacional em 23-10-1951 com o intuito de cumprir o magno preceito inscrito no art.198, § 1º da Constituição, relativo à aplicação de parte das verbas federais de assistência ao Nordeste através de crédito aos agricultores  e industriais do Polígono das Secas. Depois de muitas discussões a Lei nº 1.649 foi sancionada em 19-07-1952, que é a data comemorada como de constituição do BNB.

Conforme o relato de Rômulo Almeida, para que não fosse adiada a organização do Banco, o Presidente Getúlio Vargas  constituiu uma Comissão Incorporadora por decreto de 29-4-1953 e um ato que  autorizou o Ministério da Fazenda a colocar  à disposição dos incorporadores um valor de cruzeiros,  “que era a quota do Tesouro no capital inicial  do Banco, que assim foi logo realizada integralmente, para a  pronta instalação do Banco do Nordeste do Brasil”.

A referida Comissão Incorporadora foi constituía de Rômulo Almeida, Francisco Vieira de Alencar (cearense) e Cleantho de Paiva Leite (BNDS) os quais cumpriram sua missão com grande êxito com a subscrição de 30% das ações do Banco de investidores particulares, Estados e Municípios nordestinos.  Em 15-1-1954 o Banco do Nordeste foi constituído  em Assembleia  Geral de Acionistas, realizada em Fortaleza, sede do estabelecimento. Os recursos operacionais que o BNB contou inicialmente foram os 0,8% da renda tributária, como parte dos 3% dos recursos destinados ao combate dos efeitos das secas. Essa fonte de meios financeiros para operações do banco foi eliminada na Constituição de 1967.   Vale antecipadamente lembrar que outras fontes de recursos operacionais do Banco provieram do sistema de incentivos fiscais  conhecidos como artigos 34/18( 1961), depois transformado no Fundo de Investimento do Nordeste (FINOR, 1975)  e o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE),  instituído na Constituição de 1988. É oportuno relembrar o que os membros da Comissão Incorporadora do Banco afirmaram naquele momento de constituição do novo Banco (Rômulo Almeida, Francisco Vieira de Alencar e Cleantho de Paiva Leite):

“NÃO NOS CABE FORMULAR PROGNÓSTICOS  QUANTO À TRAJETÓRIA DO BANCO DO NORDESTE  DO BRASIL. ENTRETANTO,  VIVA É A CONFIANÇA  QUE TODOS TEMOS  EM  QUE ORGANIZAÇÃO  TÃO NECESSÁRIA  E OPORTUNA  COMO ESTA  NASÇA PREDESTINADA  AO MAIS PUJANTE ÊXITO, DE VEZ QUE CORRESPONDE A UM VELHO ANSEIO DO POVO NORDESTINO”.

Para primeiro Presidente da entidade, Vargas nomeou Rômulo Barreto Almeida, em 27-8-1953, a qual toma posse em inícios de 1954. O primeiro concurso público para admissão de pessoal foi realizado no dia 18 de janeiro de 1954. De minha parte, ingressei no BNB por concurso público, para estudantes de economia e matemática, realizado em outubro de 1956, para a função de estatístico do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE).

As Atividades Iniciais do BNB

Uma das primeiras providências do Dr. Rômulo como Presidente, além da seleção de pessoal para operacionalizar as funções do Banco, foi buscar assistência técnica internacional para organizar o Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste e outras atividades  da nova instituição que tem características de uma agência de desenvolvimento, diferenciada dos modelos conhecidos no Brasil.

Outras  iniciativas pioneiras do BNB acionadas pela direção do Banco em sua fase inicial de operação foi o  estabelecimento da Associação Nordestina de Crédito e Assistência Técnica ( ANCAR), com a colaboração do Banco do Brasil. Teve início nessa fase  um trabalho sobre artesanato, com o SENAI;  e com o Ministério da Viação foi organizado uma rede de armazéns,  e com  o Ministério da Agricultura e governos estaduais  estruturar o sistema de revenda de equipamentos agrícolas. Foi também implantada a Carteira de Assistência às Cooperativas.  Cada um desses programas possui uma história rica de experiências que precisam ser analisadas por quem trabalha em desenvolvimento rural do Nordeste.

O Dr. Rômulo Almeida permaneceu pouco tempo como Presidente do Banco e não teve tempo de realizar algumas coisas que eram seu grande sonho. De fato, com oito meses que o Dr.  Rômulo estava em pleno exercício de suas funções, o Presidente Getúlio Vargas faleceu,  cometendo um traumático suicídio que abalou a nação.  No dia seguinte desse acontecido, Dr. Rômulo foi para o Rio de Janeiro e  apresentou sua renuncia  ao novo Presidente Café Filho(01-09-1954). Como substituto temporário da presidência do Banco foi indicado o Dr. Olavo João Galvão, que já era Diretor (16-9-1954). A seguir foi nomeado o Dr. José da Costa Porto (7-5-1955).

Em três de março de 1956 foi substituído pelo ex-governador do Ceará, Dr. Raul Barbosa, que já ocupava a Chefia da Assessoria Jurídica do BNB “pela sua competência, seriedade e conhecimento da Região”, conforme declarara Rômulo Almeida quando o indicou para este cargo.    Coube ao Dr. Raul Barbosa  a grande tarefa de organizar  o Banco em bases permanentes. Durante 10 anos, foi fiel aos objetivos que inspiraram a sua criação, resistindo às tentativas do clientelismo regional e firmemente dedicado ao programa de desenvolvimento econômico do Nordeste. (3-3-1956.1-2-1961/6-2-1962.153-1967).    Para detalhar melhor a gestão desse Presidente, com o qual tive a honrosa oportunidade de colaborar, escrevi um livro que foi lançado na solenidade comemorativa de aniversário do BNB, em formato gráfico e em modo e-book, cujo título é “Raul Barbosa no Banco do Nordeste, Sisnando, LCR”. Depois de Raul Barbosa vieram outros grandes presidentes, cada um merecendo relembrar seus feitos e dedicação a uma causa que é realizar um desenvolvimento equilibrado, sustentável e justo para essa grande Região.

O BNB e a Missão de Stefan Robock

O novo livro que escrevemos e acabamos de lançar na Associação Amigos em Ação, com a presença do Sr. Presidente do BNB Ramildo Rolim,  tem como o tema  “Desenvolvimento do Nordeste  do Brasil Revisado”.  O estudo   trata do desenvolvimento econômico do Nordeste. São as memórias  dos esforços  pioneiros das equipe técnicas e da administração  do Banco do Nordeste do Brasil em  diagnosticar e propor  políticas ,estratégias  e programas para implementar  um novo enfoque econômico idealizado com a criação dessa Instituição pelo Presidente Getúlio Vargas em 1952.

Para a realização desse grandioso projeto, o Banco do Nordeste  contou com  a participação da assistência técnica das Nações Unidas  por meio do perito economista Stefan H. Robock, no período de 1954-1956, além de outras visitas especiais ao Nordeste.. Ele deu consultoria para a estruturação  do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE)  e conduzir o programa de seleção e treinamento  dos pioneiros técnicos  desse Departamento Econômico do BNB.

Foi juntamente com essa competente equipe que  o BNB realizou um programa de desenvolvimento  econômico jamais  visto na história do Brasil e da América Latina.

O Novo Livro sobre Desenvolvimento Econômico Regional e o BNB (Sisnando)

Em geral o primeiro foco de interesse do economista nas áreas subdesenvolvidas tem sido as grandes diferenças  econômicas “ entre países” ou “dentro de um país”. No Brasil o problema mais sério do atual estágio de desenvolvimento econômico é a pobreza absoluta e relativa que ultrapassa todos os padrões toleráveis de julgamento humano.  Ao mesmo tempo, as desigualdades econômicas e sociais ameaçam a estabilidade politica e social da região  e travam o desenvolvimento do País.  A pouca  atenção dos últimos governos para a solução desses problemas  clama por uma revisão das politicas e estratégias  concebidas criteriosamente  no passado no seio do Banco do Nordeste elaboradas pelo Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE) . A  SUDENE também precisa ser reestruturada, pois  que desde a sua refundação perdeu na  prática suas funções essenciais.

O leitor pode acessar o Site onde se encontra o livro no qual   exponho toda a história da evolução das atividades realizadas pelo Banco do Nordeste  a sua criação por quem viveu e acompanhou  todos  esses acontecimentos nas diversas funções técnicas  e administrativas ocupadas.  O Site é o seguinte,  da  Academia Cearense de Ciências:    www.aceci.com.br

 

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