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Depoimento sobre algumas ações para reduzir a pobreza no Ceará, por Pedro Sisnando Leite

Pedro Sisnando Leite é economista com pós-graduação em desenvolvimento econômico e planejamento regional em Israel. Membro do Instituto do Ceará  e da Academia de Ciências Sociais do Ceará. É professor titular (aposentado) do programa de mestrado (CAEN) da UFC, onde foi também Pró-Reitor de Planejamento. No Banco do Nordeste, ocupou o cargo de economista e Chefe da Divisão de Estudos Agrícolas do Escritório Técnico de Estudos Econômicos. No período de 1995-2002, exerceu a função de Secretário de Estado de Desenvolvimento Rural do Ceará. Publicou cerca de 40 livros em sua área de especialização e escreveu muitos artigos para jornais e revistas.

O Comitê que oferece o Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel escolheu três economistas para essa honraria no ano de 2019: Abhij Banergee (1961, Calcutá); Ester Duflo (1962, Paris) e Michael Kremer (1964) “por sua abordagem experimental da redução da pobreza”. 
Aliviar a pobreza é um dos maiores desafios atuais nas economias subdesenvolvidas  e esses acadêmicos fizeram contribuições decisivas às politicas e aos incentivos a serem aplicados, explica o Comitê do Prêmio. Os dois primeiros são professores no Instituto de Massachusetts(MIT). Kremer  leciona na Universidade Harvard. 
Tratando desse assunto com o Dr. Raphael Bar-El, Professor Emérito da Universidade de Ben-Gurion (Israel),  ele sugeriu que eu escrevesse um pouco sobre a nossa experiência aqui no Ceará sobre os programas e iniciativas que trabalhamos juntos no Banco do Nordeste e no Governo do Estado do Ceará,  com a cooperação dos acadêmicos israelenses. Na verdade, há vários livros escritos pelas pessoas que trabalham nesse particular, mas geralmente são obras de circulação restrita e pouco lidas.  Este artigo, portanto, abordará essa questão.
Há décadas os governantes do Ceará estão empenhados em realizar um desenvolvimento econômico acelerado, com menos pobreza, melhor distribuição de renda e mais emprego. As várias tentativas de avançar na superação dessas mazelas da sociedade cearense levaram a uma conclusão dos planejadores e governantes. Não existe um “modelo” universal para viabilizar esses objetivos. Cada caso necessita de sua própria estratégia e combinação de ações de acordo com as prioridades e as condições locais. A escolha dos caminhos a seguir com essa finalidade, dependerá das características econômicas, sociais e políticas de cada situação e cada momento histórico. 
As Nações Unidas, por exemplo, estabeleceram uma meta para que os países subdesenvolvidos reduzissem os seus índices de pobreza em 50% entre os anos de 2.000-2015. O conhecido Prof. Jeffrey Sachs, que coordenou essa campanha para o novo milênio, falou em visita ao Brasil que é necessário adotar novas estratégias para viabilizar esse propósito na América Latina e na África. A preocupação dessa Instituição se justifica, pois o fosso entre ricos e pobres tem se alargado em alguns países nos últimos anos, além do surgimento de bolsões de pobreza relativa  nos próprios países desenvolvidos e industrializados.
É oportuno lembrar que nos últimos 50 anos foram transferidos para os países do Terceiro Mundo um trilhão de dólares, que fluíram para investimentos faraônicos, muita corrupção, assistencialismo improdutivo e armamentos, com pouco desenvolvimento econômico por falta de políticas adequadas no tocante ao desenvolvimento humano.   
Em conseqüência disso, tem sido crescente o interesse das reuniões internacionais dos países mais ricos para tratarem da problemática da pobreza, como aconteceu em Davos, e na Escócia com os países do G-8. O Banco Mundial também patrocinou um magno encontro na China para avaliar essas políticas de ajuda internacional e propor políticas inovadoras para o cumprimento das metas de desenvolvimento do novo milênio. O próprio Governador Tasso Jereissati esteve presente nessa reunião como palestrante As Universidades de Cambridge e o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) promoveram  uma reunião conjunta para avaliar os conflitantes resultados de aumento da pobreza nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, apesar do rápido crescimento econômico ocorrido nesses países. O objetivo deste encontro foi também avaliar as perspectivas desse problema no âmbito do desenvolvimento regional e intercambiar experiências, como fez também em importante conferência o Centro de Políticas Públicas Regionais da Universidade de Glasgow (Inglaterra), para citar apenas alguns casos. Aliás, foi nesta Universidade onde Adam Smith (fundador das Ciências Econômicas), ensinou aos seus alunos que “nenhum país é rico e opulento se a maioria do seu povo é pobre e miserável”.
Nesse contexto, a criação do “Projeto Ceará”  com foco na redução da pobreza e das desigualdades, de iniciativa do Governo Tasso Jereissati , tornou-se um empreendimento providencial e oportuno. Como se sabe, o crescimento da economia cearense ao longo de muitos anos tem sido excepcional, mas as mudanças nos índices de pobreza e desigualdade não seguiram o mesmo padrão. Em consequência disso, foram tomadas providências para o  ajuste nas políticas com relação a essa problemática de modo que fossem aprimorados os programas de inclusão social que marcam o ideário de desenvolvimento econômico do Ceará há muitos anos. 
A nova estratégia para a redução da pobreza com o simultâneo crescimento econômico teve  como foco a desconcentração metropolitana para núcleos regionais, globalização econômica em nível estadual, fortalecimento de cidades secundárias e regionais e solução das falhas de mercado que distorceram o crescimento econômico do Ceará nas últimas décadas. Com essa engenharia de reestruturação da economia e da ocupação do espaço físico ocorrerá uma reorientação das tendências de metropolização da economia cearense e melhoria das desigualdades. A questão do desenvolvimento rural é também parte essencial da equação do enfoque global para a redução da pobreza do Estado. Essa modelação do “Projeto Ceará” foi analisada e discutida em muitas reuniões internacionais. Muito divulgado em revistas científicas de grande renome e avaliado por muitas personalidades do mundo acadêmico mundial. Podem ser mencionados como exemplo os nomes dos famosos professores Walter Isard (que criou nos Estados Unidos a ciência regional), Gilbert Benhayou (Universidade Aix-Marseille, na França), Jimy Weinblatt (Universidade de Ben-Gurion, Israel) Joel Pelziman (Universidade George Washington, Estados Unidos), David Jakobson (Universidade de Dublin, Irlanda).
Os estudos e implantação desse programa pioneiro para renovar os enfoques de desenvolvimento com equidade e menos pobreza têm contado com a efetiva participação da equipe de professores e consultores da Universidade de Ben-Gurion (Israel), desde o ano de 2.000 até 2006 no Governo Lúcio Alcântara.  
A ideia dessa parceria de cooperação internacional surgiu como conseqüência da seca de 1998, que afetou profundamente a economia rural do Ceará, com grandes perdas de safra e mobilização de frentes produtivas que atenderam cerca de 300 mil famílias.  A interrupção do ciclo de crescimento econômico continuado desde 1987, chocou o governo do Estado que pensava haver superado as graves consequências que advêm de uma crise climática como a desse ano.  
 A Secretária de Desenvolvimento Rural, objetivando construir um desenvolvimento mais equitativo e sustentável, submeteu ao Governador um novo plano, denominado de “Rumo ao Desenvolvimento Rural do Ceará”. Dentre as estratégias propostas, constava a diretriz de buscar a criação de emprego não agrícola no quadro rural. Isso para contrabalançar a liberação de mão de obra, que advirá em conseqüência do aumento de produtividade, que é um dos objetivos das novas políticas de redução da pobreza, além de buscar reduzir o grande subemprego existente nesse setor. Os agricultores  representavam quase 40% de toda a população ocupada no Estado, gerando apenas 6% da renda. 
Para desenvolver ações com essa abrangência e complexidade, A Secretaria de Desenvolvimento Rural resolveu pedir ajuda a pessoas com conhecimento e experiência nesse assunto. Além do apoio científico local, recorremos, aos professores e especialistas israelenses que haviam, anteriormente, dado uma grande ajuda ao Banco do Nordeste na pesquisa e organização de programas de desenvolvimento regional e industrialização rural do Nordeste.  
Feitos os contatos e examinadas as possibilidades, com a aprovação do Senhor Governador, teve início esse trabalho, com o apoio de  professores da Universidade de Ben-Gurion (Israel). A coordenação era do Prof. Raphael Bar-El com a participação de seus colegas: Dra. Dafna Schuwartz e David Bentolila, como equipe básica. É de justiça registrar o total apoio dos governadores Tasso Jereissati e Lúcio Alcântara e suas equipes de secretários que participaram e colaboraram com os referidos professores para que esse empreendimento fosse realizado da melhor maneira possível. Merece especial destaque a liderança do Secretário Alex Araújo e sua equipe da Secretaria de Desenvolvimento Local e Regional para o êxito desse empreendimento. No dia 22 de novembro de 2006  foi lançado um livro, pela Secretaria de Desenvolvimento Local e Regional de autoria dos principais participantes desse projeto: “Desenvolvimento com Equidade e Redução da Pobreza- o Projeto Ceará”
No tocante a abordagem das diretrizes de políticas contidas nesse livro, vale destacar algumas ações já em execução pelo Governo do Ceará com vistas a corrigir o que os autores denominaram de “falhas no mercado”. Ou seja, apoio à reestruturação espacial regional e o fortalecimento de alguns centros urbanos secundários e terciários  como base para mudanças de oportunidades econômicas. A segunda diretriz era o desenvolvimento de atividades não agrícolas nessas regiões, em setores econômicos com potencial de crescimento. A terceira diretriz era o aumento da produtividade rural através de investimentos público em educação, infra-estruturas, organização regional e políticas de desenvolvimento agrícola. 
De certo modo  estivemos até agora praticamente tratando das ideias no âmbito macro-econômico e das politicas econômicas. No Governo Tasso Jereissati, por exemplo,  o carro chefe de suas ações era o Projeto São José de Combate à Pobreza Rural executado com o apoio financeiro do Banco Mundial e a gestão do Secretário de Desenvolvimento Rural (Pedro Sisnando Leite -1995-2002). Esse Projeto foi reconhecido mundial pelo seu sucesso  prático exclusão clientelista. De 1995-2000 foram aplicados US$ 100 milhões com o atendimento de 176 municípios e 5.648 comunidades com 300 mil famílias (cerca de um milhão de pessoas). Um Diretor do Banco Mundial, Joachhim Von Amsberg, disse que o Projeto São José “Tem um histórico de infindáveis  projetos bem sucedidos”, razão porque anualmente recebia dezenas de delegações de observadores de várias partes do Mundo. Como gestor desse Projeto, jamais recebi qualquer interferência do governo ou de setores políticos na aprovação desses projetos.
No Governo Lúcio Alcântara também foi organizado um grande projeto de apoio ao esforço de atendimento às populações excluídas do processo de  crescimento econômico estadual. Foi a criação do Fundo Estadual de Combate à pobreza, em 2003, com recursos provenientes de 2% do ICMS. Calculando esses recursos  aos preços de hoje, estimo que estão sendo arrecadados mais ou menos R$ 300 milhões anualmente para serem aplicados em programas para apoio de pessoas ou comunidades extremamente pobres. Tem-se muito a falar sobre essa iniciativa, mas  aqui não será possível numa Crônica jornalística. Se o leitor tiver interesse em melhores detalhes poderão acessar alguns dos livros que tratam desses assuntos gratuitamente, no Site indicado da Academia Cearense de Ciências: www.aceci.com.br.

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